O QUE QUASE DEU CERTO
Na estação do inverno
Em que o sol, por momentos, se aposenta
Os dias são quase sempre pardacentos
As bocas lacradas, quase não riem,
Os corpos a quatro chaves se fecham
E ermas almas buscam o insulamento
Nas ruelas tortuosas e obscuras da solidão.
As árvores emagrecem e desnudam de folhas
Os pássaros desnudam-se dos parques
E os parques perdem toda a cor da tez
No tempo de inverno
Em que o sol da vida humana se aposenta
E os dias pardacentos a tudo acinzentam
As bocas murchas quase não riem
O isolamento invade as nossas fendas d alma
E os corpos artríticos seguem a esmo
Vagueando insepultos mundo afora, afora o mundo,
Perdidos na soleira deste poço sem fundo
Rendidos de solidão na aridez deste solo interno
Que o tempo-enxada rasga nas entranhas de nós mesmos
Há o tempo de florir
Incandescer
De maturar
E envelhecer
(como vive a apregoar famoso “Homem do Tempo”)
Eu,
Que quase nunca sei de mim, nem sei do tempo,
Se fico ao sol deitado assim, ou me aposento,
Procuro sempre a face mais externa d alma
E de vara de pescar em punho
Labuto por sacar destas ruelas pardacentas
Tortuosas, obscuras e distantes
Algum sonho bom de primevas primaveras
Quando ainda havia cor pelos parques do mundo –
Meu mundo – e o inverno estava longe do horizonte
Agora só,
Já nem sei mais o que acontece
Será isto um sonho, ou mesmo anoitece?
E aquela chama, será este pavio apagado?
Espécie exótica de bilhete que nasceu não premiado
Minto, até quase deu, não fosse o sorteio sempre adiado.
E este homem todo alquebrado, será que sou eu?
E este cheiro de palito queimado, é meu?
E este inverno vindo tão branquilento, lento.
Porquê meu Deus? Se eu nem estou preparado.
Mas o “Homem do Tempo” jamais se engana
E da ampulheta, sinistramente virada,
Os grãos fininhos de inverno, tenuamente caindo,
Vão soterrando, na areia branquinha, outro incauto
Que sonhou enganar as leis do destino
Se escondendo num semblante de menino
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